sexta-feira, 29 de março de 2019

A IGREJA NA DITADURA MILITAR - Parte 02

A resistência de parte da Igreja Católica e seu apoio ao Golpe Militar de 1964 no Brasil.

O apoio da Igreja Católica

Com a ameaça de se estabelecer no país o socialismo marxista, entendido hoje, como o Comunismo, a Igreja viu-se ameaçada pela invasão de teorias tidas como heréticas considerando seus dogmas. 

O apoio despendido pela Igreja Católica no início do governo militar foi providencial para a concretização do golpe. Essa mobilização por parte da Igreja ocorreu, principalmente, como combate à ameaça do Comunismo, com sua crença ateísta, e o crescimento inerente dos movimentos de esquerda durante a década de 1960. A ação da Igreja não foi muito diferente de diversos setores da sociedade que, temendo e desintegração e a desordem social, se aliaram ao regime (Ana Carolina Machado de Sousa, 2011, historiandonet07).

Houve dentro da Igreja uma divisão de conceitos, trazendo à tona movimentos políticos de esquerda e direita. O setor mais conservador ganhou a discussão e cedeu forte apoiou o golpe militar que deu origem aos 21 anos de opressão no Brasil. A Igreja, através de seus bispos mais influentes e conservadores, entendiam que a ditadura não se estabeleceria por muito tempo, e que por falta de apoio público a situação se estabeleceria logo, mas no momento de crise o mais importante era exterminar a ameaça do comunismo, o que seria perigoso e desastroso para a Igreja Católica e até as protestantes terem sua continuidade com livre expressão no país. 

Em meados de abril de 1964, numa reunião no Rio da qual participei como membro da direção da Ação Católica, houve uma furiosa discussão entre bispos conservadores e progressistas, tendo ganhado o setor conservador. E a CNBB oficialmente apoiou o golpe por ter livrado o Brasil da ameaça comunista (Frei Betto, 2004, Entrevista UOL).

A certeza de que a ditadura não se fortaleceria falhou, ela não só se aprimorou na sua crueldade, no seu desrespeito aos direitos humanos, principalmente a partir de 1968 com o Ato Institucional nº 5 (mas conhecido como AI-5), como também durou 21 anos, uma época que a Igreja e ninguém esperava que acontecesse. 

A Origem e a Punição na Teologia da Libertação 

A Teologia da Libertação surgiu na metade do século XX baseada em dois momentos registrados na Bíblia. Primeiro momento foi a saída do povo de Deus do Egito, onde sofreu com a escravidão e opressão, e o segundo momento foi o resgate do próprio Cristo ao libertar o ser humano do seu estado de sofrimento na terra, morrendo e implantando o reino de Deus aqui na terra. 

Como a teologia tradicional importado da Europa não condizia com a realidade vivida pela massa latino-americana, escravizado e oprimida pela exploração colonial, o desejo de liberdade bate à porta de uma ala progressista da Igreja. 

A teologia da libertação é resposta à problemática pastoral da Igreja, especialmente colocada no contexto latino-americano, em que a luta pela libertação constitui uma exigência fundamental do Evangelho e uma antecipação do Reino de Deus... A salvação de Deus não é um simples estado d’alma, nem, muito menos, uma salvação após a morte, mas uma libertação histórica, a ser desfrutada, aqui e agora, pela pessoa e pela sociedade (CATÃO, 1986, p. 63 e 67).

Leonardo Boff ao olhar para esta “nova” teologia, disse que “não se trata de outra fé, mas da fé dos apóstolos e da Igreja articulada com as angústias e as esperanças de libertação dos oprimidos” (BOFF, 1986, p. 65). Dessa maneira, a Segunda Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano de Medellín 

estabelece com vigor que os cristãos precisam se empenhar na luta contra as estruturas injustas da sociedade latino-americana e que este empenho é fundamental e básico para toda ação pastoral. Em antítese à Primeira Conferência, de 1955, a Segunda Conferência, de 1968, orientou a ação da Igreja a partir da promoção humana e da libertação, colocando em cheio a questão do sentido teológico desta ação, questão para a qual a teologia da libertação propõe uma resposta (CATÃO, 1986, p. 57). 

Foi com esse discurso de libertação que os expoentes Frei Betto e Leonardo Boff lutaram contra a opressão causada pela Ditadura Militar no Brasil. 

Tinha perdido a esperança. Que é pior do que perder a fé. Quando o Vaticano interveio na Vozes em 1992, depuseram toda a direção, nomearam um alemão como interventor, que a primeira coisa que fez foi pegar os nossos livros e mandar picotar e queimar. Pegou o arquivo todo da Teologia da Libertação, aquela coleção de cinqüenta tomos, trabalho fantástico de bispos, de teólogos de toda a América Latina, pegou aquilo e jogou no lixo, para ser levado pelos caminhões: ainda consegui correr atrás e salvar. E disse que a Vozes, eu e a Teologia da Libertação fizemos uma chaga muito grande na Igreja e que essa chaga devia ser sanada. E deu uma guinada fantástica na Vozes, que passou a ser uma editora de direita, fechada, contra a Teologia da Libertação. E virou censor pessoal meu. Cada artiguinho que eu fazia ele corrigia tanto, que não dava nem pra publicar. Senti uma profunda humilhação da inteligência: uma editora que ajudou a pensar o Brasil mais à esquerda, o cristianismo mais de libertação, sofrer esse tipo de intervenção. Aí eu digo: "Não, isso é injusto. Um editor que manda queimar livros, como pode ser um editor?" (BOFF, 1998, Site TERRA).

Mesmo com toda luta de resistência e opressão ocorridas durante os 21 anos de ditadura no Brasil, Leonardo Boff continuou seu discurso progressista e crítico em relação às ações da igreja, da qual ele considerou corrupta e desfavorecida aos mais pobres. Discurso que viria incomodar o Vaticano. Em seu livro Igreja, Carisma e Poder, Boff divergia da doutrina católica com respeito à hierarquia da Igreja, esse discurso lhe rendeu um processo junto à Congregação para a Doutrina da Fé. O processo foi finalizado e assinado pelo Cardeal Joseph Ratzinger, foi condenado ao silêncio, perdendo sua cátedra e funções editorias que mantinha na Igreja Católica.

Wilton Lima

Parte do trabalho apresentado no curso de Jornalismo na disciplina de Metodologia do Trabalho Científico, ministrada pelo saudoso professor Gerison Kesio, em 2014.

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